22 junho 2005

Vergílio Ferreira, «Escrever», # 65, pg. 48

Só tarde reparei que o «eu» de que tenho falado não tem «explicação». Há muitos anos já que o venho tentando e penso que sempre sem êxito. E só recentemente reparei que não tinha explicação porque era uma «vivência». Alguém sabe explicar o que é a alegria, o medo, o amor e o mais? A alegria vive-se, o medo experimenta-se, e só se diz pelos gestos ou face de quem o sente. O que julgo separar-me de quantos falaram do «eu» é que o reduzem a um conceito e o meu «eu» não o tem. Era o que o narrador de Aparição tentava transmitir aos outros. Só talvez o Bexiguinha o terá entendido bem. Mas esse era um louco. Vê tu se és capaz de te sentires a existir. Não é seguro que enlouqueças. E se enlouqueceres também não tem importância. Soubeste ao menos o que é seres.